Ponto de Vista

Palavras-chave: coronavírus, mutação, psicologia, redução do dano, tecnologia e saúde mental.

Keywords: coronavirus, mutation, psychology, harm reduction, technology, mental health.

Inicia-se este Ponto de vista reportando-se a uma das perguntas mais simples e determinantes na área da saúde mental: “Quando você se sentiu que estava vivendo meio ao adoecimento e se apercebeu que a sua condição psicoemocional estava se agravando?”; momento pelo qual os profissionais da saúde são convidados e desafiados a estarem preparados – profissionalmente - pessoalmente e espiritualmente. Há séculos que a humanidade vem sendo demarcada por fases de pandemias adversas com sofrimentos e consequências muitas vezes irreversível ao curso natural da vida, como:

a Peste Negra ou Bubônica (1340/1360) - doença devido à precariedade de hábitos de higiene da sociedade medieval, a Cólera (1817) - infecção pelas más condições de saneamento básico, a Tuberculose (1.000 a. C) - importante infecto patologia da história causada por bactérias, a Varíola (séculos XVIII e XIX) - doença infectocontagiosa exclusiva do homem, transmissão causada pelas vias respiratórias, a Gripe Espanhola (1918/1919) - infecção viral altamente contagiosa e de fácil disseminação entre as  populações,  a Aids (1981) - doença causada pela infecção do Vírus da Imunodeficiência Humana/HIV, a Gripe Suína (2009/2010) - devido uma mutação do vírus Influenza, c a SARS (Severe Acute Respiratory Syndrome, em inglês) e o covid-19 (Coronavírus Dissesse) - doença respiratória causada pelo coronavírus (Gasque et al., 2020).

Nesse panorama histórico saúde x doença, apreende-se novos cenários, pois:

Há uma, importante parcela de trabalhadores da área da saúde que foi acometida pela COVID-19, especialmente a categoria da enfermagem. Percebe-se que o país apresenta fragilidades nas suas instituições pública e privadas de saúde, desde a falta de materiais de insumos, até a carência de profissionais qualificados. A pandemia do novo coronavírus demostrou que muitos trabalhadores da área da saúde estão adoecendo dentro destas instituições, e infere-se que muito dessa relação de causalidade é pela exposição ao vírus, possivelmente acentuada pela falta de equipamentos de proteção básicos para o exercício da profissão (Santos, et al., 2020).

Nesse tempo de uma nova pandemia causada pelo coronavírus e suas variantes, identifica-se um cenário atípico para a população e para os profissionais da área da saúde decorrendo problemas multifatoriais, ou seja, com afetação sobre as áreas de saúde – organização social – política – economia – família – meio laboral – contexto educacional - vida psicoemocional – lazer – etc. Pois grande número de pessoas ainda desconhece e se mostram temerosas sobre como lidar com esse assombro, deparando-se com indícios de sofrimento e estresse elevado devido as sobrecargas de trabalho e/ou episódios de vírus na família, de incertezas e descrenças relacionadas aos poucos e antagônicos parâmetros científicos, de desamparos e afastamentos ou perdas e lutos sentidos tão precocemente.

A psicologia, como ciência e profissão, também se viu implicada meio a esse turbilhão de mudanças e demandas advindas dessa intercontextualidade, pois na medida em que o vírus se alastrava em uma velocidade assustadora e com impactos em várias partes da vida humana, os psicólogos tiveram que reavaliarem suas práticas e processos a fim de reduzir os impactos da pandemia na saúde mental das pessoas.  Para Danzmann, Silva e Guazina (2020), atuar em psicologia no contexto do Coronavírus é uma novidade, visto que a profissão é deficitária em questões relativas à prática interventiva de emergências e desastres, morte e luto e atendimento online, bem como, outra questão desafiante é o que causa sofrimento nos pacientes como os rituais de despedida.

Face às novas demandas de distanciamento/sitiamento social e práticas preventivas de saúde objetivando a minimização dos riscos e redução de danos, a tecnologia se tornou uma aliada ímpar em vários processos de trabalho implicando a quebra de paradigmas, ampliação das possibilidades e estreitamento das distâncias - o espaço clínico “das poltronas e divãs” é reconfigurado para as “abas e links” de acesso. O atendimento online na psicologia foi autorizado em 2018 pelo Conselho Federal de Psicologia através da Resolução 011/2018, porém pouco difundido até o advento da pandemia, quando o número de solicitações de cadastros dos profissionais para esse tipo de serviço, em 1 mês, ultrapassou o número de cadastros realizados em 2018 até início de 2020 (CFP, 2020).

Um campo onde a Psicologia terá muito para intervir, pois o ser humano defronta-se com um dos maiores confrontos e estressantes das etapas da vida, o da sua própria morte repentina e inesperada; a morte de alguém querido, próximo, de relações familiares; e a confrontação com uma acentuada alteração de paradigmas sobre os valores, os primados, os fatores determinantes e importantes que outrora figuravam no alto das prioridades, remetem-se a um valor quase insignificativo; e verdadeiramente determinante para a sobrevivência, para o bem estar físico, mental, psicológico, emocional e espiritual (Esteves, 2020).

Esse tipo de atendimento psicológico online, antes refutado por muitos profissionais e que acreditavam não ser capaz de produzir o vínculo terapêutico, passou a ser estratégico durante a pandemia da COVID-19, uma vez que as demandas de trabalhos clínicos aumentaram exponencialmente e numa diversidade de motivações, em um momento em que se preconiza o distanciamento social. Para Viana (2020), esse tipo de atendimento deve ser encarado com a devida seriedade, haja vista que a oferta de serviços psicológicos online exige profissionais capacitados para realizar o diálogo entre as técnicas de intervenção clínica e as tecnologias disponíveis.

Mesmo com tantos empecilhos e desafios demandando mudanças e readaptações a nível intercontextual, os profissionais da psicologia se mostram empreendedores e favorecendo a possibilidade de continuidade dos atendimentos, como a implementação de iniciativas de psicoeducação virtuais através de palestras, debates, lives e a criação de produtos; cursos, mentorias, maratonas temáticas e materiais para conhecimento. Schimidt et al. (2020) afirma que há escassez de profissionais capacitados para acolher essas demandas, e, se não bastasse, há outros desafios que limitam a oferta de apoio psicológico nesse momento; como a falta de internet para alguns brasileiros, pouca habilidade dos idosos em usar as tecnologias de informação, dentre outros.

A utilização das TIC - Tecnologias de Informação e Comunicação pelos profissionais da Psicologia exige a reflexão sobre três questões complementares e que estão pautadas na primeira Resolução nº 003/2000, e perpetuada pela Resolução nº 012/2005, nº 011/2012 e atualizada pela resolução nº 11/ 2018,

[...] é dever da (o) psicóloga (o) prestar serviços psicológicos de qualidade, em condições de trabalho dignas e apropriadas à natureza desses serviços, utilizando princípios, conhecimentos e técnicas reconhecidamente fundamentados na ciência psicológica, na ética e na legislação profissional (Brasil, 2000; 2005; 2012; 2018).

Também, há que nos atentarmos para os aprendizados - desafios e implicações acarretados pela pandemia do coronavírus, quando todos os seres humanos sem distinção de raça ou cor ou escolaridade ou cultura ou história foram indiscriminadamente impactados de forma indireta ou indiretamente por situações e vivências de perigo – medo – fatores de risco – sitiamentos – isolamento completo – fases prolongadas de hospitalização - perdas e lutos. Quando após os momentos de tormenta assombrosa povos e culturas e cada um de nós, tivemos que nos movimentar em direção a busca de novos significados – esperanças – reparações – ressignificações e realinhamentos da vida, “das órbitas do planeta”!

Por último e considerando-se de extrema importância e sonoridade demarcadora sobre o social – o familiar e especificamente, as relações interpessoais foi o reaparecimento e resgate do humano, da mobilização e sensibilidade para a proximidade com o outro mesmo que em restritos nichos e possibilidades de vivências; bem como, historicidade inscrita sobre o acordar para os diálogos e a busca de novas trocas e encontros humanos através de outras janelas - as janelas dos computadores e da alma.

Autores: Gema Galgani da Fonseca, Nilson Silva
Citação: Fonseca, G.G., & Silva, N. 2021. Dos sitiamentos e implicações acarretadas pela pandemia-Covid 19, às novas demandas para a atuação do psicólogo na intercontextualidade. Pubsaúde, 7, a172. DOI: https://dx.doi.org/10.31533/pubsaude7.a172
Editor: Pubsaúde.
Recebido: 29 mar. 2021; Aceito: 19 mai. 2021; Publicado:  15 ago. 2021
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Conflito de interesses: Os autores declaram não haver conflito de interesse.

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Referências

  • Gema Galgani da Fonseca

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